quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

“Bicla”


Estou em crer que a primeira emancipação de um “homem”, naquela idade pós-5/6 anos, é largar de vez as rodinhas extra na bicicleta. Ou seja: passava-se pela primeira vez a “homem” quando se conseguia andar de bicicleta mais de 25 metros em linha recta sem batota.

E comigo aconteceu precisamente o mesmo. Mal pude, com mais vergonha do que coragem, armei-me em crescido e pedi para que as rodinhas, feias, por sinal, me deixassem à minha sorte. 

Nos primeiros dias, claro que o álcool, água oxigenada e uns pensos assumiram papel preponderante no estancar do sangue que fazia questão de sobressair entre as pisaduras conquistadas nas inúmeras quedas. “Dores do ofício”, argumentava eu, mesmo sem me convencer, nem aos outros. 


Na verdade, acho que nunca tive grande jeito para andar de bicicleta, mesmo sabendo fazê-lo, refira-se. Sempre tive a tentação de descer a minha Rua da Pitada a uma velocidade jeitosa, especialmente quando havia público, mesmo que composto por um ou dois elementos. É que foram várias as quedas, ou melhor, vários "espalhanços" contra a parede, tão simplesmente por não conseguir dar uso ao guiador, indo sempre em frente. 

Naquela altura, meados da década de 70, estou em crer, havia uma qualquer força estranha que me fazia não reagir, mesmo vendo e confirmando que, se não desse uso ao guiador e aos travões, certamente que acabaria por aterrar nos paralelos, provocando lágrimas, embora sempre disfarçadas, claro.

A minha bicicleta da altura, nada comparável à da imagem que aqui anexo, por estranho que pareça, sofria menos danos do que eu, principalmente quando passava do portão para dentro, já que, ao contar “a choramingar” à minha mãe que tinha caído - daí estar sujo e aleijado, ainda acabava por chorar mais, já que me eram servidas umas chineladas. (a bicicleta limita-se a assistir, em silêncio)

Sempre gostei de ter uma bicicleta e do processo de ir ao “garanjeiro” (oficina de motociclos e bicicletas) tapar os furos ou afinar os travões, sendo obrigado, amiúdas vezes, a esperar uma semana para ver o assunto resolvido… É, era interessante ter bicicleta, principalmente por podermo-nos aventurar para lá dos 500 metros que nos distanciavam de nossa casa e, já agora, por se ter a hipótese de tentar sentar uma rapariga no quadro e dar-lhe boleia, mesmo que caíssemos 5 vezes durante as curtíssimas viagens… Era giro!

Ainda hoje, para ser verdadeiro, acho que nunca consegui atingir uma relação demasiado próxima com a minha bicicleta de então, eventualmente pelo respeito e desrespeito que lhe fui ganhando com as quedas que coleccionei. E isso traduz-se no simples facto de, ao contrário dos outros, eu tratá-la por bicicleta e não por “bicla”, como se dizia.

Kiko


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