sábado, 16 de março de 2013

“Sair à Noite”


O sair-se à noite, bem no início da década de 80, para a minha (nossa) geração, era porventura um momento digno de ficar registado no para sempre da memória, tamanha era a ansiedade, o receio de fazer má figura, o não saber o que fazer, o que vestir, o que dizer, como dar um ar adulto, embora tendo 11 ou 12 anos de idade, por aí… Mas era excessivamente importante, era quase como perder a virgindade, embora num contexto público e não privado, embora muito menos preocupante, não deixando de ser ridiculamente enervante. (sorrisos)

E o que me leva a fazer as palavras deambularem por esta minha primeira saída à noite é o facto de, por mais que me esforce, não me conseguir lembrar do local onde terei ido, do que terá acontecido de marcante, por aí, e apetece-me, quanto mais não seja para conseguir definir e avaliar as impressões que tive na altura. (esta cabeça já não é o que era! – risos)

Obviamente – e penso que será comum a todos. – que a primeira saída à noite foi à tarde, porque era à tarde que se começava a sair à noite. (ponto)

Confuso? Bizarro? Português maltratado? 

Nada disso. Na verdade, as saídas começavam à tarde, fosse por ser mais fácil conseguir-se autorização dos encarregados de educação, fosse porque, naquele tempo, haviam formas de transformar as tardes em noites, mesmo que se entrasse em “pseudo-discotecas” (“escurizadas”) à tarde e se saísse ainda com a luz do dia a raiar, no fuso do verão, claro.

Mas em termos de saída à noite, com noite, como não me consigo lembrar, vou inventar um espaço e tentar transportar-me para essa altura, sendo que, se bem me conheço, não estarei muito longe do que terá realmente acontecido.

Imagino que os meus amigos mais velhos, não muito, mas mais velhos, terão convencido a minha mãe de que iríamos ao cinema, porventura à sessão da meia-noite, porque o tal filme só daria àquela hora. Depois, acredito que apanhamos o autocarro, fomos a um café mais frequentado para “fazer horas” e, sempre a olhar para o relógio, ao jeito de “Cinderelo”, muito provavelmente teremos arrancado para uma discoteca, o local mor das imaginadas saídas à noite. Isto, claro, sem esquecer a preocupação latente pela (in)certeza de o porteiro (não) me deixar entrar, por (efectivamente) não aparentar ter 16 anos – a idade minimamente aceitável, longe disso. 

Depois de entrar na tal discoteca, fosse ela o “ArsNova” (é assim que se escreve?), a “Rock’s” ou outra qualquer (eventualmente um bar onde também se dançasse), certamente que me senti mais adulto do que nunca, mesmo que tenha pedido uma ou duas Coca-Colas com muito gelo, eventualmente na expectativa de que, quem me visse, imaginasse que o copo também teria whisky. (santa ignorância) 

Estou em crer de que passei aquelas duas ou três horas a olhar para tudo e mais alguma coisa e, muito provavelmente, devo ter-me sentido deslocado, para não dizer deslocadíssimo. 

Imagino também que, acossado pelos amigos, eles já com mais experiência noctívaga, devo ter tentado fazer “olhinhos” a uma miúda mais ou menos gira, a qual certamente me ignorou. (claro que, oficialmente, devo ter dito que fui correspondido, para não ficar mal)

Depois de ter dado a entender que dancei, sem o ter feito, por não saber e por ter uma vergonha eventualmente insuportável, acredito que terá começado o contra-relógio do: “vamos embora”, porque a sessão cinematográfica inventada já se teria despedido, e eu sempre tive a mania de ser cumpridor, quanto mais não fosse para garantir autorização para próximas investidas naquele novo mundo, o tão sonhado e desejado mundo da noite.

Em jeito de conclusão desta minha primeira saída à noite, embora não me lembre dela - repito, estou em crer de que: entre o último autocarro, um táxi ou “penantes”, deve ter sido um regresso a casa com muitas histórias conversadas, a maior parte delas inventadas, sonhadas ou desejadas, já que, em resumo, aquela primeira vez certamente que não foi mais do que um par de Coca-Colas com muito gelo, uma vergonha escondida pelas luzes da bola de espelhos e um mar de perspectivas que se abriram pura e simplesmente por ter aval de um porteiro de discoteca, dissesse o que dissesse o bilhete de identidade. 

Kiko

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